Topo

Histórico

Categorias

Blog da Karina Oliani

A conquista do K2 e a difícil volta: às vezes, é preciso explodir rochas

Karina Oliani

01/10/2019 04h00

O K2 não é o tipo de lugar onde você diz "chega" e vai embora para casa. Para sair daqui temos que caminhar cerca de 120 km por uma trilha extremamente complexa com gelo, neve, sedimento glaciário, rochas, pequenos desertos e rios. Tudo isso para chegar a nossa metrópole local chamada Askole, com seus 200 habitantes, onde só é possível chegar com veículos fortes. De lá, temos mais um dia de carro até o aeroporto mais próximo. Claro que esse dia pode virar dois ou três se a sorte não acompanhar. Às vezes, é preciso usar pás e tratores para retirar o gelo da estrada, ou até colocar dinamite para remover rochas. Rezar ajuda também.

Além do isolamento geográfico, estamos um tanto incomunicáveis e não sabemos muito do que está acontecendo no Brasil. A pouca comunicação que dispomos usamos pra falar com a família e tranquilizá-la (ou tentar).

O apoio do staff é muito importante nesta montanha. Tivemos uma mistura de HAP (High Altitude Porters) do Paquistão e vários sherpas nepaleses. Nosso time de seis integrantes que trabalhavam na cozinha fez verdadeiros milagres. Mesmo a 5000 metros de altitude e com ocasionais 20 °C negativos, eles conseguiram fazer bolo e pizza! Claro que não é como comer uma costela assada, mas é realmente impressionante o quanta criatividade eles têm para cozinhar. Já na altitude são os Sherpas que dominam. Tendo a melhor genética do mundo para ambientes elevados, os Sherpas vêm de longe para trabalhar no K2 e possibilitam que muita gente consiga ter uma boa estrutura numa montanha deste calibre.

Nessa expedição, além do montanhista Maximo Kausch, estava acompanhada do Nima Sherpa.

Por todas as previsões do tempo que analisamos, dia 18 de junho seria uma ótima janela de cume, com temperaturas e ventos mais amenos. Só que o K2 não permitiu que aqueles 120 escaladores que estavam tentando conquistá-lo chegassem dessa vez. Uma enorme avalanche varreu duas cordas fixas que permitiam que os montanhistas chegassem ao cume.

Então, todos foram obrigados a descer, já que uma tempestade se aproximava. Mas não descer para o próximo acampamento –descer a montanha toda, até o campo base!

Isso (somado ao risco de se estar escalando a montanha mais mortal do mundo) fez com que cerca de 100 pessoas desistissem. Eles voltaram pra casa sem cogitar a possibilidade de uma segunda tentativa.

Mas eu, meu pequeno time e mais umas 15 pessoas resolvemos ficar e ver se a natureza nos permitiria uma segunda janela de cume. Nesse tempo, o Nims Dai, um escalador nepalês considerado um fenômeno mundial pela velocidade com que escala montanhas de 8.000 metros, chegou ao acampamento base cheio de energia, positivismo e com novos Sherpas para tentar o K2.

As previsões de tempo também colaboravam e mostravam uma possível janela no dia 25 de julho. Foi o que precisávamos pra refazer as mochilas e apenas dois dias depois de ter retornado de 8.100 metros, voltarmos a subir logo atrás do time do Nims, que fixava novamente as cordas varridas pela avalanche.

 

Na montanha, a persistência pode ser a morte. Mas, no nosso caso, foi a chave do sucesso. Dia 25 de julho, as 4:45 da manhã, com o sol nascendo e colorindo as montanhas da maneira mais mágica que já vi, eu, Nima e Maximo pisamos no topo da segunda maior montanha do mundo.

 

Sobre a Autora

Karina Oliani é médica, especialista em sobrevivência e fã de treinamento, nutrição e esportes de aventura. Já escalou o Everest duas vezes e foi a primeira mulher sul-americana a subir a montanha mais alto do mundo por suas duas faces. Também é bicampeã brasileira de wakeboard e snowboard, além de ter encarado aventuras como atravessar um vulcão em atividade, caçar tornados e a Aurora Boreal. Entende de treinamento físico e de nutrição esportiva.

Sobre o Blog

Aqui, Karina Oliani vai compartilhar todos os segredos de treino e alimentação para as aventuras que você quer viver: escalar, correr, nadar, voar. Além disso, com o passaporte recheado de carimbos, será uma ótima guia de viagens para destinos incríveis.

Karina Oliani